Em 08/02 o plenário do STF firmou tese de repercussão geral de que uma
decisão judicial definitiva, ou “coisa julgada”, a respeito de tributos recolhidos de
forma continuada, perde seus efeitos caso a Corte venha a decidir em sentido
contrário da decisão transitada, isso por alteração no quadro fático e jurídico que
a justificou.
A origem do julgamento são dois recursos da União contra decisões obtidas por
contribuintes ainda na década de 90 (um da Braskem e outro da Textil Bezerra
de Menezes) que as permitia não pagarem Contribuição Social sobre o Lucro
Líquido, por inconstitucionalidade. Ocorre que em 2007 o STF reconheceu a
constitucionalidade da cobrança da CSLL e apenas os poucos contribuintes que
obtiveram até então uma decisão definitiva continuaram não pagando, de certa
forma gerando uma quebra de isonomia e desequilíbrio concorrencial.
Houve divergência dos Ministros quanto a necessidade ou não de modulação de
efeitos, que faria a decisão valer apenas para a frente, tendo sido vencedora a
corrente de defendeu não caber modulação. Assim, em relação à questão
específica do pagamento da CSLL, aquelas empresas que foram autuadas após
a decisão de 2007, deverão pagar os valores dos créditos tributários já
constituídos no passado, além dos últimos 5 anos. Esse é justamente o ponto
que atrai maiores críticas.
Em relação a casos futuros, em que o STF vir a decidir diferente do que vinha
fazendo, a tese ressalta que devem ser respeitadas a irretroatividade, a
anterioridade anual (para impostos) e a noventena (para contribuições), ou seja,
impostos voltam a ser devidos a partir do ano seguinte e contribuições após
transcorridos noventa dias.
O Ministro Barroso ainda comparou o não pagamento da CSLL após 2007 à
insegurança de uma ida ao cassino, opinando que algumas empresas fizeram
uma aposta e perderam. Desconsiderou sua excelência que o contribuinte
apostou numa decisão judicial definitiva e acreditou na segurança jurídica.
Perdeu Mané!
Essa decisão não impacta de imediato outras matérias tributárias, mas sinaliza
grande flexibilização da coisa julgada, cláusula pétrea da Constituição e um
grande desrespeito à segurança jurídica e à proteção da confiança do
contribuinte, dois princípios constitucionais dos mais relevantes.
A decisão que algumas empresas obtiveram no passado foi equivocada, mas
transitou em julgado. Então agora, com uma demora agravante, o STF oferece
uma solução pior que o problema e com consequências perigosas que atingem
a todos.
Exemplificativamente, se no futuro o STF julgar que é constitucional o ICMS
compor as bases de cálculo do PIS e da COFINS, todas as empresas voltariam
a pagar, independente de terem ou não uma decisão transitada e sem a
necessidade de a Fazenda promover uma ação rescisória da coisa julgada,
como o era até agora.
E não se trata simplesmente de uma derrota das empresas, mas de perdas para
a economia e aumento do descrédito nas instituições. Insegurança e falta de
confiança geram retração de investimentos e consequentemente menos
arrecadação. Perdemos todos!
A tese já refletiu em um julgamento no STJ, numa Ação Rescisória em que a
Fazenda buscou reverter julgamento do próprio STJ favorável ao Sindicato das
Empresas de Comércio Exterior de SC, transitada em 2015, e que afastava a
cobrança do IPI sobre a saída de produtos estrangeiros do estabelecimento do
importador. Há outras matérias que poderão ser impactadas em breve. Aí vemos
que há consequências que já podemos mensurar, mas outras tantas que ainda
vamos descobrir.
A irretroatividade e respeito à anterioridade para a volta da cobrança dos tributos,
incluída na tese, não se prestam a garantir a segurança jurídica, como querem
fazer crer a Fazenda e o STF. Inclusive porque a cobrança quanto ao passado
pode ser buscada via ajuizamento de rescisórias. Já para os casos em que um
tributo é julgado inconstitucional, quem tinha sentença definitiva desfavorável,
deixará de pagar o tributo para a frente, mas não terá direito a buscar o que
pagou a mais no passado, enquanto vigia sua coisa julgada, isso por força de
um parecer de 2011 da própria Procuradoria Geral da Fazenda Nacional.
Discussões judiciárias se avolumarão e a matéria está longe de ser pacificada.
É a mais alta Corte do País atrapalhando o futuro e tornando o passado é incerto.
Maristela Cardoso da Rosa – OAB/RS 096.430 – CRC/RS 056.740
Especialista em Direito Tributário
Arnold da Fonte & Cardoso da Rosa Sociedade de Advogados