Por Nicole Roth
Para quem acompanha a carreira de Quentin Tarantino, assistir a Os Oito Odiados é como reencontrar velhos amigos. Kurt Russell, Tim Roth, Michael Madsen, Samuel L Jackson e até Walton Goggins já são atores que trabalharam com o diretor antes, o que faz com que suas aparições tenham um quê de familiaridade – espertamente, faz o espectador que vem acompanhando a filmografia de Tarantino já nutrir, de cara, certa afeição pelos personagens, sem mesmo conhecê-los primeiro.
A própria temática soa familiar: uma caçador de recompensas (Kurt Russell) e sua prisioneira (Jennifer Jason Leigh) encontram abrigo, durante uma nevasca, em um armazém, que também abriga vários personagens peculiares, de moral duvidosa. A história se passa no Wyoming pós Guerra Civil Americana, então as animosidades por conta da luta pelo fim ou manutenção da escravidão ainda estão altas. O familiar aqui, então, se deve à temática do ódio: temos o ódio entre os yankees (contra a escravidão) e confederados (pró escravidão), que é espelhado no racismo perfeitamente retratado no filme anterior de Tarantino, Django Livre, e também é observado na história alternativa da Segunda Guerra Mundial que o diretor conta em Bastardos Inglórios. Com este Oito Odiados, Tarantino fecha o que pode ser chamada de uma Trilogia do Ódio – três filmes cuja história se desenrola no passado, mas cujo rancor reverbera até hoje.
Aqui, além do racismo, que vemos o personagem de Samuel L Jackson experimentar em tela, há a questão fundamental que debate o que é justiça: como diz o personagem de Tim Roth, em certo momento do longa, naquele tempo, o que a sociedade civilizada chamava de justiça determinava que a prisioneira fosse enforcada após ter sido condenada em um julgamento – faz o espectador se perguntar o quanto a sociedade atual evoluiu ou não, nesse ponto. É uma questão incômoda, presente na maneira com que a prisioneira é tratada pelo caçador de recompensas – ele bate nela,demonstrando um comportamento violento diversas vezes, apenas tendo o cuidado de fazer com que ela chegue viva para o julgamento. O filme também faz questão de mostrar que essa é uma peculiaridade do personagem: ele receberia a recompensa mesmo que a trouxesse morta – sem ser capaz de ter um julgamento em sua defesa.
Talvez, o grande problema do oitavo longa metragem de Tarantino seja que até o filme nos mostrar a que veio, se passa mais da metade da fita – que tem mais de 2h30. Embora sempre divertido e inteligente, os diálogos de Tarantino, depois de certo ponto, passam a soar como uma enrolação para preencher a tela até o momento em que a história finalmente põe as cartas na mesa.