Gestão Foss, em Araricá, emprega dezenas de parentes de vereadores e secretários

Araricá – Existe uma dificuldade enorme dos gestores do município (e no Brasil) em conseguir separar o que é público e privado.

Levantamento autônomo do Grupo Repercussão, com base no Portal da Transparência, revela uma estatística surpreendente: são quase 30 pessoas que possuem parentesco ou com o prefeito Flávio Foss (PSL), com o vice-prefeito Pedro Kautzmann (MDB), vereadores e secretários da Administração.

Para entender a legalidade dessas contratações, via de regra feitas de forma direta pela Prefeitura ou empresas terceirizadas, o Repercussão conversou com o professor do curso de Direito da Faccat, Ricardo Silveira Castro. “A súmula vinculante 13, que trata de casos de nepotismo permite que prefeitos(as) indiquem o cônjuge, irmão ou parente até terceiro grau como secretário”, cita o advogado constitucionalista.
Além de empregar como secretária a própria esposa, Foss assinou e avalizou a contratação de uma série de parentes do atual vice-prefeito Pedro Kautzmann, do MDB. Ligados ao prefeito Foss, têm empregos com salários acima do mínimo nacional sobrinhas, nora e o irmão, Paulo Foss (este eleito vereador, mas que atua como secretário).
Por sua vez, o vice-prefeito tem em cargos estratégicos a filha, o genro, a filha adotiva, a cunhada e até o irmão empregados na Prefeitura ou em terceirizadas.
O peso dos cargos na Prefeitura de Araricá pode ser percebido pelo excesso de secretarias no comparativo com outras cidades. Ao todo, são 17 secretarias criadas e ativas no governo Foss, o que gera um alto impacto orçamentário aos cofres públicos com o pagamento de salários.

Laços de família na Prefeitura de Araricá

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Cargos de Secretários e Vereadores

Advogado analisa caso de Araricá

O advogado do curso de Direito da Faccat diz que é necessário cautela quando se analisa eventuais casos de nepotismo. “Precisamos avaliar se o cargo que está sendo questionado, eventual situação de nepotismo, é de natureza política ou não. Acontece que do ponto de vista da moralidade pública o excesso de parentes pode ser encarado como um problema. Isso merece uma avaliação crítica por parte da sociedade quando a esfera do público fica extremamente confusa com a esfera privada. Isso demonstra a dificuldade que nós, no Brasil, temos de separar a esfera do público do privado ”, avalia Ricardo.

Contraponto

A advogada e assessora jurídica da Prefeitura de Araricá, Ana Luiza Orsi, encaminhou o seguinte contraponto ao Grupo Repercussão. “Ressaltamos que os cargos não se configuram como funções de confiança em geral, que possuem natureza administrativa, mas sim, dizem respeito a função do âmago dos cargos políticos. A nomeação de parente, cônjuge ou companheira para cargos de natureza eminentemente política, não se subordina ao Enunciado Vinculante 13, consoante jurisprudência pacificada. A nomeação para cargos políticos é conduta lícita, até porque a previsão de nomeação do primeiro escalão pelo chefe do Executivo está no art. 84 da Constituição Federal. É importante ressaltar que a mera existência de parentesco não constitui, por si só, fundamento jurídico idôneo para se determinar a exoneração ou impedir uma nomeação/designação, sob pena de ofender outros princípios, como o da presunção de inocência. Se assim o for, está o Estado a negar a uma pessoa, de maneira abstrata e indistinta, uma fonte de sustento e meio de subsistência garantida a todos e a todas, pelo simples fato de possuir parentesco com outrem (parentesco natural ou civil), o que não nos parece razoável e compatível com o texto constitucional”, cita a advogada.

Comentário: Vinicius Bondan* cita a Súmula Vinculante 13

O nepotismo sempre foi vedado pelos princípios da administração pública previstos no art. 37 da Constituição, mas somente a partir de 2008 passamos a ter norma concreta com a edição da Súmula Vinculante 13 pelo STF, já que não há lei nacional dispondo sobre o tema. Segundo o STF, as autoridades não podem nomear cônjuge, companheiro ou parente (em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive) seu ou de outra autoridade do mesmo órgão. Também não podem ajustar com autoridade de outro órgão nomeações recíprocas de forma a nomear parentes indiretamente, o chamado nepotismo cruzado. A única discussão ainda em aberto é a possibilidade de nomeação das pessoas referidas na Súmula Vinculante 13 para os chamados cargos políticos, que são os de Ministro de Estado, Secretário de Estado e Secretário de Município. Sobre isso, o STF ainda vai decidir no julgamento do Recurso Extraordinário 1.133.118, que teve reconhecida repercussão geral.

*Vinicius Bondan é advogado e especialista em Direito Púlico