Comentário: Empatia, por Gian Cristiano Wagner

Por Gian Cristiano Wagner, jornalista (MTB – 17975/RS)

No jornalismo existe uma espécie de “filtro” que faz o profissional da área ou o veículo, seguindo sua linha editorial, decidir quais assuntos são mais relevantes. Esse filtro é chamado de valor notícia. É tão básico que esquecemos que o valor das coisas, não só da notícia, é relativo ao valor que nós, social e culturalmente, damos àquilo.

No início do mês de março, Arthur Lula da Silva, sete anos, virou anjo precocemente. A morte em geral é algo doloroso, do qual aceitamos por obrigação e ocultamos nosso medo da única coisa inevitável já conhecida até hoje. Quando a morte atinge alguém de mais idade, que teve experiências, conseguimos nos conformar quando argumentamos estrategicamente entre nós mesmos que esta era a hora. Já quando a morte apunhala de surpresa, nos questionamos dos nossos valores e sobre quem nós somos.

Há recém completos 23 anos da morte do grupo Mamonas Assassinas, ainda saudosos ouvimos as 14 músicas que encantaram o Brasil nos anos 90. Da noite para o dia, o 2 de março nunca mais se tornaria o mesmo.

Não tenho filhos, quem dirá netos. Não posso falar sobre como é ser pai, muito menos avô. Meus avôs eram mortos quando nasci, não sei como é ter um avô. Porém, de tudo que vi até hoje sobre essa figura, aprendi que bons avôs deixam legados e um neto marca e muda a personalidade de um avô. Para um avô, perder um neto ainda criança deve ser bastante doloroso. Mas em março de 2019, o Brasil parece ter esquecido disso. De escolta armada e blindada, Lula, precisou lidar com a morte do neto e também com o linchamento público. Filho do presidente da República afirmando que o ex-presidente não deveria ter tido o direito de velar o neto. Uma palavra de luto seria de melhor marketing para Eduardo Bolsonaro, mas ele preferiu a agressão. Atacar numa situação dessas é tão desumano e desnecessário quanto bater em cachorro morto.

Lula está preso em Curitiba, acusado, julgado e culpado. A oposição já está no poder. Não vejo nenhuma motivação para atacar algo tão sensível, como a morte de uma criança. Lula já é a persona non grata da nação. Os 14 anos de PT e de Lula já acabaram. E se Lula ainda representa alguma ameaça ao Governo, a culpa é deste governo mesmo que, nem em uma situação de luto, é capaz de deixar o lado político ideológico para atacar a oposição.

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