“Tem que mostrar a cara do vagabundo”, “Por que não mostra a cara dele (a)?”

Região – Em notícias de cunho policial, é comum ler comentários do tipo “por que não mostra a cara do vagabundo?”, “não colocaram o nome”, “temos o direito de ver”, dando a entender que estas informações estariam sendo escondidas, quando o fato é que fotos e o nome dos suspeitos não são repassadas pela polícia. Mesmo que fossem, seja pela curiosidade ou pelo suposto desejo de justiça da população, todos são suspeitos e contam com os princípios de presunção de inocência e direito a preservação de identidade. Assim, é necessário ter cautela.

“É notório, ainda mais nos dias atuais, onde a informação é extremamente dinâmica, que uma informação prematuramente lançada trará consequências irreparáveis aos envolvidos, o que enseja responsabilidade na divulgação dos danos, sob pena de danos materiais e morais, irreparáveis. Ainda, por outra ótica, a preservação dos dados é de importância para a própria investigação policial, de forma a não prejudicá-la, conforme prontamente prevê o art. 20, do Código de Processo Penal”, explica Rafael Guerreiro Noronha, advogado, Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal.

Preservação de identificação

“A todos a Constituição Federal e todo o ordenamento jurídico consequente são aplicados, havendo, portanto, direitos e deveres. Nesse sentido, havendo prisões (flagrante, preventiva, temporária e civil, esta última somente para devedores de alimentos), há que se preservar os nomes dos envolvidos, tanto autores como vítimas, com fulcro no artigo 5º, incisos X e LVII, da Carta Magna, no que tange ao direito de inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, bem como a presunção de inocência, onde ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Logo, por prudência e precaução, a todos os envolvidos, há de se haver, pelo menos em primeiro momento, preservação dos suspeitos e vítimas. Isto, pois, em sede de inquérito policial, diversas mudanças podem ocorrer até seu encerramento, desde desqualificação da conduta inicialmente apontada e até mesmo, ao seu final, um pedido de arquivamento com relação a determinada pessoa, anteriormente objeto das investigações”.

Quando um suspeito vira réu e culpado

Suspeito de atuar com “biqueira” de tráfico com dia certo para compra de drogas, preso em Nova Hartz | Foto: Arquivo JR

Noronha explica as nomenclaturas. “Todos são suspeitos até que o juiz receba denúncia do Ministério Público. Há um crime, o delegado vai investigar e dentro dessa investigação podem ocorrer prisões, no final da investigação ele tem duas opções: pedir o arquivamento do inquérito para o juiz, caso a pessoa não tenha participação, etc, ou fazer o indiciamento. Digamos que a pessoa foi vista matando alguém, então ele indicia pelo artigo 121 (homicídio). Neste inquérito a pessoa continua como suspeito, então ele vai para o MP, que é quem vai tocar a ação para ver se denuncia ou não. Denunciar significa que vai ter um processo judicial, a pessoa está sendo formalmente acusada, e se o juiz aceitar a denúncia, a pessoa deixa de ser suspeito para ser réu”, explica Noronha. Ainda, sobre “culpado”, é considerado apenas após trânsito e julgado, ou seja, quando já se esgotaram os recursos e é proferida a sentença.

Em resumo

De maneira sucinta, ao se publicar uma notícia policial divulgando nome e foto do suspeito, a imprensa pode acabar “crucificando” alguém que pode não ter relação alguma com o suposto crime, como o caso da Escola Base, de 1994, onde donos de uma escola infantil de São Paulo, foram acusados de abusar sexualmente de crianças. Mais tarde, o crime não se comprovou, e a imprensa havia cometido a maior injustiça da história, ocasionando a falência da escola, inúmeras ameaças, casos de depressão e processos judiciais milionários.

Identificação da vítima

Por conta disso, é imprescindível cuidado ao se publicar notícias policias. Por último, mas não menos, crimes como estupro recebem o mesmo tipo de comentário em postagens, porém, a divulgação do nome e foto do agressor, também ocasionaria na identificação da vítima, que não deve ser exposta.

Fotos: Arquivo JR