Maioria dos crimes cometidos por jovens de 16 e 17 anos da região são delitos de menor gravidade

Poucos crimes hediondos | Um dos crimes mais praticados pelos adolescentes da faixa etária são roubos a residências

Região – Reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos, conforme a proposta de emenda à Constituição que está em andamento na Câmara dos Deputados – segundo a qual jovens de 16 e 17 anos responderiam por crimes como sequestro, homicídio qualificado e estupro, ou seja, os crimes hediondos – é uma medida que vem para diminuir o sentimento de impunidade e desamparo que toma conta dos brasileiros, quando confrontados com crimes praticados por membros cada vez mais jovens da sociedade.

A maioria de casos ocorridos na região envolvendo menores entre 16 e 17 anos, porém, são de participações em crimes que não seriam afetados pela aprovação da PEC 171/93. De janeiro para cá, a maioria dos crimes envolvendo jovens nessa faixa etária são de roubos – a residência, estabelecimento comercial ou veículos – e furtos qualificados. Além destes, houveram casos de adolescentes apreendidos por receptação, tráfico e dano ao patrimônio público. Da lista de crimes hediondos, o caso que mais se destaca é o assassinato de Luan Paz Siqueira, 18 anos, ocorrido em janeiro, em Campo Bom, que envolvia um jovem de 18 anos e um adolescente de 16, que foi o autor dos disparos que mataram Luan.

Para o capitão Luciano da Cunha Veríssimo, que responde interinamente pelo 32º Batalhão da Brigada Militar, a redução da maioridade penal é fruto da falta de resultados das medidas adotadas atualmente. “O número de jovens com passagem pela polícia, na nossa região, é significativo. Algo deve ser feito”, diz o capitão.

Sobre a educação

Para o tenente Ribeiro, da BM de Nova Hartz, a questão se resume à educação. “Eu atribuo tudo isso à educação. Muitos pais abandonam os filhos. Muitas vezes falamos com pais de adolescentes, durante ocorrências, que dizem, ‘dá um jeito no meu filho que eu não consigo mais’”, comenta.

Autor de assassinato está internado na CASE

No dia 11 de janeiro, Luan Paz Siqueira, de 18 anos, foi executado em Campo Bom. O adolescente estava em frente a uma residência no bairro Cohab Sul, quando um Celta branco passou em frente ao grupo e o carona atirou contra Luan. O autor dos disparos era um menor de idade, de 16 anos, que assumiu o crime. “Ele foi internado na CASE, onde acredito que ainda esteja”, comenta o delegado Clovis Nei da Silva.

Adolescentes com vasta ficha criminal

“Não se passa responsabilidade alguma ao menor que comete o crime, o que é sabido entre os criminosos. Hoje é corriqueiro apreender adolescentes com uma vasta ficha criminal”, diz Veríssimo.

Ele reconhece que o sistema prisional hoje não está preparado para receber os adolescentes, mas, “hoje quem paga a conta é a sociedade, algo que não pode continuar”. Conforme Veríssimo, também é corriqueiro se deparar com adolescentes envolvidos com drogas. Ele também chama atenção para a relação entre o adolescente e o criminoso que o recruta para o crime. “Para o criminoso, é irrelevante se o menor vai ser preso, se vai sofrer as consequências ou não. Ele não se importa com o adolescente. Ele usa o argumento de que ‘não dá nada’ para convencer o adolescente, que entra no crime para ter uma vantagem”.

O capitão também recorda o caso de Luan Paz Siqueira. “Em Campo Bom tivemos um caso de um adolescente que assassinou o outro, o caso do sobrinho da Barbara Paz. O pai desse adolescente que cometeu o crime estava preso e o filho assumiu o papel de criminoso e praticou um crime hediondo, com a convicção de que logo será solto”.

Medida para combater a impunidade atual

Para Fernando Branco, delegado de Sapiranga, a medida também serviria para combater a impunidade. “Estou aqui apenas desde 31 de janeiro, então, falando por esse período, essa espécie de crime, o hediondo, não ocorreu com envolvimento de menores. Porém, tivemos inúmeros casos de roubos a residências praticados por jovens. Hoje a punição para quem comete crimes graves é branda. Sou a favor da redução da maioridade penal, é um começo do combate à impunidade. Aproximadamente 90% da população é a favor da redução da maioridade penal”, comenta.

Clovis Nei da Silva, delegado de Campo Bom, relata que são poucos os casos de crimes hediondos com envolvimento de menores entre 16 e 17 anos. “Temos um grande número de ocorrências com jovens nessa faixa etária, mas são crimes menores. Ano passado, tivemos um homicídio praticado por um menor de idade, cuja ordem para praticar o homicídio veio de dentro do presídio”, lembra o delegado.

Adolescentes cometem delitos menores

Para o tenente Antônio Carlos da Rocha Ribeiro, da Brigada Militar de Nova Hartz, o assunto é polêmico. “Temos bastante incidência de ocorrências com menores, mas existe também a questão de maiores atribuírem os delitos aos menores de idade. Mas, acho que a questão é totalmente educacional, é de se ver onde que eles vão cumprir suas penas. A ressocialização do menor deve ser bem pensada, se vai realmente ocorrer dentro de um presídio falido. Talvez seja necessário mais severidade no ECA”.

Já para o delegado Vladimir Haag Medeiros, de Nova Hartz, reduzir a maioridade penal para 16 anos não resultaria em efeitos práticos. “Nós não temos em Nova Hartz casos de crimes graves cujos autores são adolescentes. Em termos práticos, a alteração para ver esses adolescentes responsabilizados com prisão, em Nova Hartz, os efeitos práticos seriam zero”.

Henrique Keske* doutor em Ciências Jurídicas e Sociais

A questão relativa à redução da maioridade penal se reveste de complexidade e relevância, de forma que algumas explicações se fazem necessárias.

Em primeiro lugar, se deve destacar que a proposta agora aprovada se reveste de inconstitucionalidade, pois fere o artigo 60 e seus parágrafos, da Constituição Federal/88, no sentido de que uma proposta derrotada só pode ser reapresentada para votação no próximo período legislativo, ou seja, em 2016. Isto ocorreu porque a proposta aprovada se refere apenas a um substitutivo a proposta anterior, que havia sido rejeitada um dia antes, ou seja, foi uma manobra legislativa com que Eduardo Cunha forçou a aprovação, porém de maneira contrária à Constituição.

Em segundo lugar, faz-se necessário salientar que esta medida não se refere à redução geral da maioridade penal, mas somente em relação aos tipificados crimes hediondos, portanto, não se está operando uma redução geral da maioridade penal, para todos os tipos de crime. Assim, para todos os demais atos infracionais, praticados por menores de 18 anos, continuam a valer as disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente. Além disto, a proposta aprovada prevê, ainda, que estes menores que incorrerem nestes crimes, não serão recolhidos aos Presídios normais, junto com outros detentos,mas seriam recolhidos em Instituições especializadas, a serem criadas para tal fim. Acreditamos que, na pratica isto não vá ocorrer, o que faria com que tais menores acabassem mesmo sendo recolhidos em unidades da FASE.

O ideal seria não permitir que esse adolescente caísse na pratica do crime, bem como que se deveriam criar as condições perfeitas para sua reinserção adequada na ordem social. Entretanto, não vivemos em um mundo ideal e, enquanto tais condições perfeitas não se estruturam, fica a pergunta, formulada novamente: o Estado não deve punir? O que fazer diante do crime hediondo praticado por menor? O ECA determina o recolhimento do menor a FASE, onde permanece até a maioridade, de onde sai com a ficha criminal limpa – isto é justo e correto? As medidas determinadas pelo ECA recuperam, efetivamente, esse menor?

Penso, portanto, que o processo legislativo usado por Eduardo Cunha seja, de todo, inconstitucional, como já referido, mas, quanto ao mérito, apesar de tal medida não resolver o problema da criminalidade, não parece de todo absurda, ao estabelecer essas condições bem específicas de redução da maioridade, em caso de crimes hediondos.