Século XXI: O racismo velado e a negritude na Cidade das Rosas

Foto histórica dos primeiros negros a frequentarem um baile em Sapiranga Foto: Arquivo histórico/Prof. Doris Fernandes

Por Caroline Waschburger

Sapiranga – A luta contra o racismo e a valorização da história afrobrasileira tem sido debatida fortemente nas últimas semanas após casos que causaram a revolta da população mundo a fora. Desde então, a causa ganhou maior visibilidade através de hashtags nas redes sociais e vem deixando claro que a intolerância já não tem mais espaço.

Desta forma, a reportagem publicada na semana passada sobre a presença silenciosa dos negros na Cidade das Rosas tem continuação esta semana com relatos de cidadãos do município que buscam explicar o que é o racismo, de que forma ele se manifesta e como podemos todos ajudar a combater este e qualquer tipo de preconceito.

“Ainda que não sejam novidades ou casos isolados, casos como os de João Pedro, George Floyd e do menino Miguel, no Recife, são sintomáticos quanto a questão da desigualdade racial. Expõem algo que, infelizmente, estamos acostumados a ver, embora de forma alguma aceitamos: vidas negras sendo tratadas como algo inferior”, diz Murilo Souto Alves, de Sapiranga, ao ser questionado sobre o racismo. “É difícil canalizar o pensamento para tratar deste assunto. É muita história pessoal, não é fácil falar”, comenta o geógrafo com a equipe do JR. “Atualmente, a manifestação da intolerância tem crescido porque está havendo espaço para ela com a justificativa de ser democrático”, acrescenta.

O racismo estrutural e o mito da democracia racial

“A minha mãe tem uma história recente de uma criança que disse pra ela: “manda essa preta feia sair daqui do portão!” – segundo relato da minha mãe, uma criança de uns 3 anos na época.Obviamente foi repreendida por um adulto, mas em algum lugar ela ouviu essa frase para ser capaz de reproduzi-la dentro de um contexto com uma mulher negra. São tantos exemplos, tantas situações, que ferem, entristecem, nos deixam impotentes e que infelizmente está naturalizado. Isso é o racismo estrutural. Outro exemplo de racismo estrutural são comentários nas redes sociais. As redes perderam o status de entretenimento, para ser um ambiente muitas vezes hostil e cruel. O mito da democracia racial pode, de maneira bem simples, ser entendido através das pessoas que consideram as queixas do povo negro frente a opressão do estado e da sociedade como “mimimi”, ou como vitimização. O branco lacra, o preto vitimiza. Discursos meritocráticos e o “mito” do racismo reverso, não cabem aqui”, compartilha a terapeuta ocupacional Flávia Matias.

De que forma podemos ajudar?

Flávia, de Sapiranga, diz: Para ajudar a combater o preconceito, precisamos estudar, pesquisar, buscar literaturas de intelectuais negros, temos vários, rever as próprias atitudes, os próprios termos usados no dia a dia. O mundo não está chato, o mundo está mais consciente e não aceita mais reproduzir atitudes e conceitos depreciativos e preconceituosos.

A geração de agora tem mais representatividade, ocupa mais espaços e tem mais visibilidade talvez em função do avanço do mundo digital, das relações interpessoais mais conscientes e de políticas públicas. A luta do povo negro é muito próxima a luta das pessoas com deficiência, a luta das mulheres, a luta da população LGBTQ, a luta indígena, entre outras. “Queremos respeito e dignidade”, completa.

Colocações que merecem destaque

Murilo Souto Alves, geógrafo, de Sapiranga.
“Negros tem vida, voz, história, cultura e somos cidadãos. Mas não há respeito, como se o que temos para falar, demonstrar ou relatar fosse menos importante e não precisa ser valorizado. É importante ocupar espaços, conviver, dialogar e respeitar a história de cada um”.

Flávia Matias, terapeuta ocupacional, de Sapiranga.
“Eu vejo que uma atitude talvez não isolada mas coletiva de racismo e preconceito, é a extinção do carnaval no município. O carnaval é cultura popular, a maior festa popular do planeta e a relação dessa festa com a cultura afro-brasileira é muito estreita”.