Pedidos de intervenção militar em protestos levantam questionamentos

Região – Durante os protestos dos caminhoneiros diversas placas e cartazes pediam pela intervenção militar e isso fomentou uma antiga discussão sobre intervenção militar e Regime Militar. Conforme o professor de Direito da Universidade Feevale, Dr. Henrique Alexander Keske, o Regime Militar se instaurou no Brasil por fortes influências internacionais. Após o fim da 2ª Guerra Mundial, o Brasil e todos os países da América Latina passaram a pertencer à zona de dominação dos Estados Unidos. Com medo do avanço das chamadas esquerdas políticas, foram impostas forças conservadoras nestes países.

Durante o Regime, os direitos políticos e civis foram violados, principalmente com o Ato Institucional nº 5 (AI-5), quando parlamentares foram cassados, juízes aposentados e a repressão militar e policial aumentou. Direitos humanos foram violados, ocorreram prisões ilegítimas e tortura. Além disso, jornais, revistas, livros, peças teatrais, exposições culturais foram censurados.

Com padrões econômicos norte-americanos, o país ficou dependente do sistema rodoviário. Ocorreram investimentos em infraestrutura viária e telecomunicações, principalmente, com a expansão das empresas estatais. Além disso, geração de empregos, PIB em 12% e inflação em 18%, marcou o Milagre Econômico, mas junto surgiu a dívida internacional.

Regime Militar é golpe de Estado e não é igual a intervenção militar

Keske destacou que Regime Militar e intervenção militar não podem ser consideradas iguais. O Regime Militar no Brasil se deu a partir de um golpe de Estado, onde as Forças Armadas assumiram os poderes de Estado no país. Já a intervenção militar é uma operação pontual, que busca restabelecer a ordem institucional, quando esta é fortemente ameaçada, ou rompida.

Entenda

A intervenção militar é permitida conforme a Constituição de 1988. “Somente o Presidente da República pode decretá-la, como já o fez, na gravíssima situação do Rio de Janeiro, em que as forças políticas do governo não mais conseguem manter a ordem pública e a normalidade democrática. Dessa forma, os militares são convocados para este fim específico, não assumindo as funções de governo”, e alerta. “O decreto de intervenção militar atesta a falência das outras instituições do Estado em resolver o problema instaurado de ruptura da ordem social”, explica o professor.

Além disso, como assegurado pela própria Constituição – através da liberdade de expressão -, é permitido se manifestar a favor da intervenção militar.

o que motivou o pedido?

Questionado pela reportagem do Repercussão quanto aos motivos que levam a população a pedir pela intervenção, Keske diz: “Infelizmente, existe um sentimento generalizado na população, e se trata de uma percepção tristemente correta, de que as instâncias políticas do Estado, principalmente o Poder Executivo, liderado por Michel Temer, o mais impopular presidente da história brasileira, bem como da descrença na articulação do próprio Congresso Nacional ensejam um pedido destes, voltado para uma instituição que, a princípio, se mantém focada na ordem e na disciplina. A falência do Governo Federal e do Congresso, cujas principais lideranças se encontram totalmente envolvidas com os escândalos de corrupção, cria este sentimento de impunidade que a população pretende ver resolvida pela intervenção militar.

Entretanto, tal ação não é permitida pela própria Constituição; e parece que os militares brasileiros atentaram para este preceito democrático. Contudo, forças políticas retrógradas e conservadoras, confundem intervenção militar com o pedido de retorno ao regime militar, o que traria graves consequências, inclusive para o movimento dos caminhoneiros, como para todos os direitos democráticos do país.

Vale lembrar que há um grave engano quando se refere ao fato de que em tal período não havia corrupção e desordem, haja vista que não havia liberdade de imprensa, nem aplicação da Justiça, de forma que a corrupção e a criminalidade não eram inexistentes, mas, sim, impossibilitadas de serem divulgadas. A própria Operação Lava-Jato não seria possível em um regime militar. É preciso deixar claro que só há uma possibilidade: o fortalecimento da democracia, expressa pelo voto direto”, opina.

Texto e fotografia: Bruna Bertoldi