Novo auxílio-saúde pode aumentar em R$ 1 milhão por ano as despesas dos poderes jurídicos na região

No último dia 08 de março, a publicação de uma resolução por parte do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS) estabelecendo um auxílio-saúde para membros do Poder Judiciário ainda segue repercutindo em diferentes esferas da sociedade. Conforme o texto da resolução 04/2021, a instituição do programa de assistência à saúde suplementar, com a implantação de auxílio-saúde é destinada aos magistrados, servidores, ativos e inativos, e pensionistas do Poder Judiciário. Ainda segundo o texto, as verbas serão de caráter indenizatório, mediante ressarcimento de despesas com planos de assistência médica, hospitalar, psicológica e/ou odontológica, de livre escolha e responsabilidade do beneficiário. O valor máximo mensal será de até 10% do respectivo subsídio para os magistrados e de até 10% do subsídio de juiz substituto de entrância inicial para os servidores. Quem já recebe outro auxílio custeado pelos cofres públicos não será beneficiado.

Além de membros do Tribunal de Justiça, o benefício também poderá ser solicitado por integrantes do Ministério Público, Defensoria Pública e Tribunal de Contas do Estado. A resolução precisa de regulamentação para os benefícios serem concedidos.

Impacto da medida na região

As cidades que abrangem a cobertura dos jornais do Grupo Repercussão contam com 12 juízes, 12 promotores e sete defensores públicos, além dos servidores destes órgãos. Após a regulamentação e, caso todos passem a utilizar o novo benefício no teto de 10% previsto na resolução, o custo aos cofres públicos, somente dos auxílios para juízes, promotores e defensores, pode chegar ao montante aproximado de R$ 82 mil a cada mês, o que elevaria em cerca de R$ 989 mil a despesa anual, somente na região. Os valores podem ser ainda maiores, uma vez que os servidores de carreira destes órgãos também têm direito ao auxílio-saúde e estes valores não foram computados no levantamento desta reportagem. Vale ressaltar, ainda, que o benefício não é integrado de forma automática nos vencimentos e somente será pago após regulamentação e, caso seja solicitado pelo integrante do Judiciário, Ministério Público ou Defensoria Pública.

Deputados estudam maneiras legais de barrar o pagamento

Logo após a publicação da resolução, diferentes órgãos e entidades manifestaram posição contrária à instituição do benefício. Na Assembleia Legislativa, a Frente Parlamentar de Combate aos Privilégios começará a analisar a legalidade do pagamento. Os deputados se reuniram, de forma virtual, no dia 10 de março, para avaliar mecanismos jurídicos e legislativos com o objetivo de combater o benefício. “Numa pandemia sem precedentes, MP e Judiciário se autoconcedem um aumento disfarçado. Este auxílio terá um impacto milionário, uma vergonha para o Estado”, afirmou o presidente da Frente Parlamentar, deputado Fábio Ostermann (NOVO).

A Seccional do Rio Grande do Sul da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS), em nota assinada pelo presidente Ricardo Breyer, também manifestou seu descontentamento com a medida. “Presente a pior fase da mais grave crise de saúde pública no Estado e no País, a OAB/RS vem manifestar sua preocupação e indignação diante da autorização de criação do denominado auxílio-saúde pelo Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul, bem como pelo Ministério Público e Defensoria Pública do Estado”, cita. “Nesse contexto, a entidade lamenta que estejam sendo ampliadas despesas de pessoal do Estado, por meio de um de seus Poderes constituídos, direcionando-se novos benefícios aqueles que se encontram no topo da pirâmide salarial no âmbito público”.

Judiciário explica que cumpre determinação do CNJ

Após a publicação da resolução, datada de 08 de março, e diante das manifestações contrárias de entidades, o Tribunal de Justiça publicou, no dia 10 de março, uma nota de esclarecimento. No documento, o desembargador Antonio Vinicius Amaro da Silveira, presidente do Conselho de Comunicação Social do TJ/RS destaca que a resolução cumpre determinação do Conselho Nacional de Justiça implementada em 2019 e que nenhum membro do tribunal receberá o pagamento de forma imediata.

Confira a íntegra: “O Tribunal de Justiça (TJRS) informa que a Resolução nº 04/2021 regulamenta o Programa de Assistência à Saúde Suplementar, em atendimento à Resolução do Conselho Nacional de Justiça (nº 294, de 18/12/2019), com mais de um ano de atraso. Tal medida já foi implementada por toda a Justiça Federal e por 23 Tribunais de Justiça do país, restando apenas quatro, entre eles, o TJRS. Assim, a Resolução do TJRS nada mais fez do que cumprir a determinação do CNJ, dependendo ainda de regulamentação. Importante esclarecer que nenhum pagamento será efetivado de imediato. Necessita-se da realização de estudo aprofundado para definição dos valores, que dependerão inclusive do escalonamento por faixas etárias, bem como dos percentuais que serão aplicados em relação ao teto estabelecido. Por fim, será ainda efetivado o devido juízo de conveniência e oportunidade pela Administração do Tribunal de Justiça para viabilização da medida em questão.”

“Legal, mas imoral”

Mergulhado na pandemia, o Brasil sofre com o número de mortes e a recessão econômica em virtude da restrição de atividades. Nesse sentido, o cientista social e professor da Faccat, Claudecir Barbosa da Silva, entende que a instituição do benefício, no momento atual, é extremamente repudiável. “Duas linhas precisam ser observadas, uma da legalidade e outra da moralidade. Do ponto de vista legal, essa resolução do TJ/RS está em conformidade com a determinação do CNJ, ou seja, totalmente legal. Observando o viés da moralidade e do apreço pela responsabilidade social onde a justiça é o bastião desta, é uma atitude descabida, principalmente neste momento de dificuldade em que o país está passando. Não se pode deixar transparecer a sociedade que o órgão que aplica as sanções para arbitrariedades de um mau exemplo de descaso com as finanças públicas. Essa medida aflora o descaso com o sofrimento alheio”, enfatiza.