Espera por consultas especializadas e cirurgias afeta milhares de cidadãos

Região – Milhares de pessoas, em todo o Estado e o País, aguardam por cirurgias e consultas especializadas junto às Secretarias de Saúde. Dados obtidos pelo Repercussão junto à Secretaria Estadual de Saúde, revelam que em quatro municípios (Araricá, Campo Bom, Nova Hartz e Sapiranga), existem 8.157 cidadãos aguardando por consultas especializadas, em diferentes áreas. Conforme informações repassadas com exclusividade ao Repercussão, as demandas são principalmente nas especialidades de cirurgia plástica adulto, otorrino pediátrico, cirurgia geral pediátrico e gastroenterologia adulto. Além de demonstrar uma grande deficiência no atendimento, os dados da Secretaria Estadual da Saúde geraram contestações por parte das secretarias municipais consultadas pela reportagem.

Em Campo Bom, por exemplo, a Secretaria de Saúde, através da secretária, Suzana Ambros Pereira, revelou que o município possui 1.565 pessoas aguardando na fila por avaliação para cirurgia geral, vascular, otorrino e traumatologia. Por outro lado, o Hospital Dr. Lauro Reus, através da direção, informou, que em 2016, foram feitas 2.240 cirurgias e em 2017, outras 2.083, uma queda de quase 8%.

A realidade em Sapiranga

O Hospital Sapiranga desenvolve cerca de 1.100 cirurgias eletivas anuais, conforme contrato com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Dados da SMS apontam o total de 1.326 pacientes aguardando por consulta especializada nos Sistemas de Porto Alegre e Canoas, sendo que a última cidade citada é referência em ortopedia de alta complexidade, e cuja fila possui 404 pessoas. Já os dados do Hospital Sapiranga apontam cerca de 162 pessoas na fila para cirurgias em geral. Para a administradora da Casa de Saúde, Elita Herrmann, a fila de espera para cirurgia geral e traumato é irrisória (dados ao lado). Ela contestou os números fornecidos pela Secretaria Estadual de Saúde, que mostra mais de seis mil pessoas aguardando por consultas em Sapiranga. Para cirurgias vasculares e ginecologia a espera pode chegar a oito meses.

Judicialização através da Defensoria Pública

A Defensoria Pública do Rio Grande do Sul está em fase de estruturação de um projeto de automação e informatização de documentos e sistemas administrativos internos, o que compromete a precisão de dados. Porém, em levantamento aplicado com as defensorias de Campo Bom e Sapiranga, a assessoria de Imprensa informou que, em Sapiranga, foram encaminhados 900 atendimentos na área da saúde. Os processos judicializados entre os sapiranguenses somam 250. Na maioria dos casos, os processos exigem o fornecimento de medicamentos.

A realidade de Campo Bom não é diferente. A assessoria da Defensoria Pública Estadual registrou um aumento de 20% nas ações ajuizadas na área da saúde. Em 2016, foram 57 ações, e em 2017, esse número aumentou para 68. Por se tratarem de demandas urgentes, sempre é requerida a tutela antecipada, para efetivar o direito no menor lapso temporal possível.

ESPERA NOS MUNICÍPIOS

CAMPO BOM: fila de espera para consulta de avaliação, conforme a Secretaria de Saúde
Cirurgia Geral: 25
Cirurgia vascular: 127
Otorrino: 871
Traumatolologia/ortopedia: 542

SAPIRANGA: Lista de espera do Hospital:
Cirurgia Geral: 46;
Traumato: 0 (cirurgias realizadas dentro do mês);
Vascular: 86;
Ginecologia: mais de 30

Especialidades mais procuradas em Sapiranga: Cirurgia Vascular, Geral e Ginecologia. Em Campo Bom: Traumatologia, Otorrino e Cirurgia Vascular

Como facilitar a vida do cidadão

Para o Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers), as filas de espera por cirurgias poderiam começar a diminuir a partir de maiores investimentos do governo em saúde, assim como a contratação de mais médicos para as diversas especialidades.

Suzana Ambros, da Secretaria de Saúde de Campo Bom, ressalta que para diminuir o tempo de espera dos pacientes é necessária uma avaliação criteriosa. “É preciso um encaminhamento já com classificação de risco pela Central de Regulação do Estado, juntamente com a ampliação da oferta de novos serviços”, declara.

A Secretária de Saúde campo-bonense ainda salienta a superlotação do Sistema Único de Saúde. “O SUS está até mesmo sem capacidade técnica instalada para o atendimento das demandas crescentes da população. Faz-se necessário a ampliação de novos serviços, assim como o reajuste de tabelas, tornando atrativo a novos prestadores e municípios”, declara Suzana.

Entrevista com Paulo Azeredo Filho, assessor técnico da FAMURS

Jornal Repercussão – O que dificulta o acesso dos usuários do SUS aos atendimentos especializados?
Paulo Azeredo Filho – São diversos problemas. Os municípios têm feito o primeiro atendimento, mas quando encaminham para a segunda esfera, ou seja, as cirurgias, tem que passar pelo médico, que encaminhará para o especialista que vai atestar o problema, por exemplo, de cálculo renal. Depois dessa etapa, o médico vai emitir um laudo, que é encaminhado do município para a Coordenadoria Regional de Saúde. Da Coordenadoria Regional de Saúde da região é autorizada conforme a regulação e qual referência o município pertence. Exemplo, o município X tem o hospital Y como referência,

Mas, o problema é o entrave na parte do Estado. Estamos com problema na regulação, casos de urgência, acabam priorizados, empurrando os não urgentes para a fila.

Jornal Repercussão – Como funciona a regulação e os hospitais de referência para o atendimento do cidadão?
Paulo Azeredo Filho – Primeiro, é necessário descentralizar os atendimentos.
Lutamos por isso e cobramos mais recursos para os municípios para que possam fechar essas pactuações com os hospitais de referência. Essas pactuações hoje, são determinadas pelas CIR e depois passa pela Comissão Intergestores Bipartipe (CIB). Nestas esferas, os secretários se reúnem e estabelecem as referências e as cotas de consultas e cirurgias para cada município. E muitas vezes, essas cotas não são suficientes para suprir as demandas dos municípios. Às vezes, não consegue nem atender o que os municípios tem direito. Temos que descentralizar a média e alta complexidade. E os repasses devem ser feitos, em dia para os municípios, e os municípios contratualizar ou compactualizar com os hospitais de acordo com a necessidade.

Jornal Repercussão – É crescente os casos de judicialização da saúde. Como resolver essa questão?
Paulo Azeredo Filho – Cresce e acho muitas vezes errado. Gostaria que o Judiciário tivesse a visão de como funciona o SUS. Essa cirurgias especializadas, elas são da cota do Estado, não são do município. Mas, quando a pessoa demora na fila e não existe vaga, o usuário vai na justiça, tenta acelerar o laudo médico. Consequentemente, o juiz no interior ingressa contra a prefeitura para a prefeitura pagar. Se dá um prazo de 72 horas para pagar a cirurgia, como o município não tem acesso a fila do atendimento especializado, isso se torna um passivo, pois a Prefeitura acaba custeando uma despesa que não é sua e acaba não utilizando a cota estabelecida pela CIR e CIB.

Estatística angustiante

271.987
usuários aguardam por diferentes tipos de procedimentos nos municípios do RS
19 mil
aguardam por consulta de cardiologia
19.143
para cirurgia geral
50.278
para procedimentos em oftalmologi

Pacientes na fila por consultas especializadas

Araricá – 178
Campo Bom – 896
Nova Hartz – 1.056
Sapiranga – 6.027
Fonte: Famurs e Secretaria Estadual da Saúde