Curva de contágio do coronavírus na região está em queda desde agosto

Fonte: Secretaria Estadual de Saúde (SES/RS)

Região – O número de casos confirmados de Covid-19 nas cidades da região apresenta forte queda nos últimos dois meses. Segundo levantamento feito pela reportagem, com base nos dados do boletim epidemiológico divulgado pela Secretaria Estadual de Saúde (SES/RS) até o dia 26 de setembro, o pico dos casos confirmados nos Vales do Sinos e do Paranhana ocorreu entre os dias 19 de julho e 8 de agosto. O levantamento regional foi realizado com os dados de todos os municípios das regiões Covid R06 – Taquara e R07 – Novo Hamburgo do Distanciamento Controlado.

Os gráficos elaborados apresentam dados semana a semana, partindo do primeiro caso confirmado na região, que ocorreu no dia 2 de março em Campo Bom (e que foi também o primeiro caso registrado em todo o estado gaúcho). Desde então, Campo Bom atingiu seu pico na semana entre os dias 26 de julho e 1º de agosto, com 334 casos confirmados em sete dias. O maior número de pessoas contaminadas no mesmo período em Sapiranga ocorreu 14 dias mais tarde, entre 9 e 15 de agosto, com a confirmação de 284 novos casos de Covid-19. Nova Hartz e Araricá, por outro lado, não chegam a apresentar um alto pico de contágio, porém tiveram a maior parte dos seus casos confirmados entre o meio de julho e o início de agosto.

No Paranhana, três das seis cidades viram o pico do contágio entre 2 e 8 de agosto: Igrejinha (118 casos), Rolante (93) e Três Coroas (106). Taquara teve os maiores indicadores entre 19 e 25 de julho, com 107 pacientes positivados. Riozinho observou 20 confirmações mais tarde, entre 30 de agosto e 5 de setembro, o mais tardio dos municípios a observar um pico. Já Parobé ficou na casa da centena de confirmações entre 12 de julho e 12 de setembro, com os maiores índices oscilando entre 156 (19 a 25/07), 155 (2 a 8/08) e 161 (30/08 a 5/09).

 

 

Índice de testagem em Campo Bom auxilia no combate

Entre os municípios avaliados, o destaque vai para Campo Bom, que, segundo o coordenador do Laboratório de Microbiologia Molecular da Universidade Feevale e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia, Fernando Spilki, é um dos municípios com maior número de testes realizados na população. Ele explica que isso causa uma elevação no número de casos confirmados, mas facilita o controle da disseminação do vírus. Sobre esta situação, a secretária de Saúde de Campo Bom, Suzana Ambros, afirma que o município já realizou mais de 5,5 mil testes, tanto o RT-PCR quanto o rápido, e já adquiriu mais 12 mil testagens dos dois tipos. “Esta foi uma escolha que tomamos no início do enfrentamento, porque se entendeu que o único jeito que nós tínhamos de controlar minimamente seria identificarmos os positivos para isolar”, afirmou Suzana. Sobre a segunda onda de casos que pode surgir, a secretária afirma que o município segue preparado. “Nós não desmontamos nada, continuamos com o Centro de Referência e a sala de retaguarda no hospital, até porque ainda temos casos graves. Continuamos atentos, e não mudamos ainda nossa estratégia de combate”, ressaltou.

 

Entrevista com Fernando Spilki

Coordenador do Laboratório de Microbiologia Molecular da Universidade Feevale e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia

Jornal Repercussão: O que explica a queda nos casos?

Fernando Spilki: Tem uma redução. Isso é dentro de um espectro, em que a gente tem grande parte das atividades fechadas. Quando se tem aglomeração, normalmente é clandestino, já que não estão liberadas aglomerações. Isso continuado por um longo tempo, é o que a gente espera, que a curva vá baixando. Claro que a gente precisa considerar que tem cidades que são um bom termômetro, como é o caso de Campo Bom, que testa muito, então a gente consegue realmente perceber um achatamento. Eu comparo esses dados apresentados com todos os municípios do Vale do Sinos, e a gente nota que existe uma redução, ela é similar à dos municípios individualmente, mas ela não é tão drástica assim. Nesses dados desses municípios tu tem uma situação que é similar à metade de maio, digamos assim, e nos gráficos da região e do estado tem uma situação mais parecida com junho ainda. É isso que precisamos considerar. Sim, o distanciamento social funciona para reduzir o contágio, e o cuidado que precisamos ter agora, principalmente nessa fase de flexibilizações, porque ainda tem casos, não é uma situação em que estamos zerados, ainda tem casos positivos circulando. Além disso, precisamos considerar que a região é muito integrada do ponto de vista dos serviços e comércio. E nós temos os municípios de São Leopoldo e Novo Hamburgo nesse contingente que mantêm a estabilidade da curva, ou seja, uma queda um pouco menor. O que a gente enxerga é que alguns municípios continuam testando muito, e outros reduziram. Um município que é um bom termômetro de testagem e que a gente considera bastante é Campo Bom. Campo Bom, quando começou a ter mais problemas em julho, começou a testar de maneira mais intensiva, e ainda é um município que testa bastante.

 

JR: Já passamos pelo pico?

FS: Dessa onda, sim. Dessa onda diria que tivemos um pico que foi ao redor de final de julho, início de agosto, variando um pouco em relação à localidade. Mas esse é o pico da primeira onda que nós tivemos na região. Ainda precisamos estar em alerta, pois uma nova dinamização pode acontecer dependendo de como manejarmos este período de flexibilizações.

 

JR: Essa segunda onda pode ocorrer quando?

FS: Vai depender muito de como vai se processar e de como as pessoas vão continuar observando ou não as medidas de restrição, o quanto vai se liberalizar de processos. Então, temos desde a atitude dos municípios, que tem sido mais cautelosa. Vemos o próprio estado liberando eventos corporativos, por exemplo, esse tipo de liberalização que, as vezes, talvez seja um pouco exagerada para este momento que nós estamos vivendo, já que nós não estamos zerados, nós temos o vírus circulando, isso é o que vai determinar quando que chega essa nova onda de casos. Eu não esperaria que a gente fosse demorar tanto para ver essa onda. Gostaria muito de estar enganado, mas o que temos visto é que ela chega num período de alguns meses após. Na Europa tem acontecido de ela chegar agora, eles tiveram o surto ao redor do inverno, e agora está chegando no final do verão, início do outono. Vamos ver como vai ser. Eu ainda acho que, lamentavelmente, eu apostaria que ainda vamos ter uma dinâmica do vírus muito forte no Brasil e no Rio Grande do Sul, ainda podemos encontrar uma nova elevação nos próximos meses, antes do final do ano. Mas temos que aguardar e ver o quanto as pessoas vão se responsabilizar por manter os cuidados.

 

JR: Passado o pico, devemos manter os cuidados?

FS: A gente não pode dizer que o pico passou e confundir com dizer que estamos em normalidade. Eu acho que essa é a preocupação. O pico passou, sim, mas ainda temos uma atividade considerável do vírus. Nós ainda encontramos de 20 a 25% de amostras positivas, que é mais ou menos a taxa que encontrávamos ao redor de final de maio, início de junho. Ainda é uma atividade que, naquele momento, precedeu uma escalada muito grande do número de casos. Tem que se manter o alerta, tem que se manter os cuidados, porque senão podemos, realmente, ter essa ressurgência muito mais breve do que o normal. Enquanto isso, enquanto estamos preocupados em priorizar atividades que ainda permitam que daqui a pouco se retorne com aquilo que é fundamental, por exemplo, o ensino, em alguns setores, como o futebol, começam a se discutir coisas que não devem ser prioridade, como o retorno do público ao estádios. Esse é o tipo de situação perigosa, pois nós não estamos conseguindo seguramente ainda ter um número de casos que pudéssemos testar e restringir a movimentação de todos os positivos, que seria uma situação para final de pandemia, realmente para debelar a circulação do vírus. Não é isso que está acontecendo. Ainda temos um número de casos, que sabemos, pela experiência, que é alto e pode ser um caldeirão para gerar uma nova onda.

 

JR: O que podemos observar em relação a uma segunda onda?

FS: A palavra de ordem continua sendo cautela. E muita atenção nos números. Esse trabalho que vocês da imprensa estão fazendo agora, de um acompanhamento muito fino dos casos da região, que a gente vê todos os órgãos de imprensa cuidado da curva, isso é fundamental. Porque nós precisamos perceber no primeiro sinal de aumento, poder público, setor produtivo e a própria população têm que estar conscientes que, no primeiro sinal de aumento, é preciso agir. Vai ser preciso restringir de novo. Na primeira onda, nós fomos avisados pelo mundo do que estava acontecendo. Nós tivemos 45 dias de antecedência, pelo menos, para pensar “está chegando, vamos fazer alguma coisa, vamos estabelecer um plano”. O plano, no Brasil, foi começar a tomar forma e ser estabelecido de fato 20 dias depois que o vírus chegou. Pelo menos 15 dias depois que já se percebia transmissão sustentável em São Paulo e outras capitais. Desta vez, para uma segunda onda, precisamos observar o que está acontecendo na Europa, o que já está acontecendo em Manaus, o que parece já estar acontecendo em outros estados. Ao primeiro sinal de elevação, quanto mais cedo agirmos, mais efetivo é. Então, começou a aumentar, tem que ser restritivo, tem que adotar medidas que evitem a disseminação. Porque se não fica no vai e volta. Esse momento que nós estamos é muito delicado. No momento em que começa a baixar a curva, é o momento que as medidas de restrição são muito eficazes. Então tem que ter muito cuidado na flexibilização para não perder a oportunidade.

 

JR: Por que há diferença e atraso na atualizações dos dados relacionados à Covid-19 por parte do estado?

FS: A base de dados do estado demora muito a ser atualizada, as vezes de sete a dez dias para vermos um caso que temos certeza que entrou ser contabilizado. Então a soma leva muito tempo. Fica essa impressão de uma diminuição ainda mais violenta, mesmo que não tenha ocorrido. Tem uma diminuição, mas talvez não tão drástica. É preciso muito cuidado no período de 14 dias de antecedência.