As vidas que ninguém vê por trás das sinaleiras em Sapiranga

Márcio Oliveira vem todos os dias de Canoas para vender em Sapiranga Fotos: Melissa Costa

Sapiranga – Todos os dias, a mesma rotina. Quase sempre estamos correndo contra o tempo, chegamos a vê-los, muitas vezes, até compramos seus produtos, no entanto, aqueles segundos no semáforo fechado são impossíveis de trocar as palavras que não sejam somente sobre os valores e troco. Muitos dos vendedores ambulantes são vistos trabalhando abaixo do sol, em horário do meio-dia, final de semana e, cada um deles, à sua maneira, tenta chamar a atenção para seu produto, que vai desde pano de prato, meias até rapadura ou maça do amor.

O que ninguém sabe, são os motivos que colocaram eles ali, na sinaleira. Batalham dia a dia para conseguir colocar o pão na mesa. O Grupo Repercussão acompanhou um pouco deste trabalho e conversou com dois vendedores, Márcio Oliveira, 43 anos, e Leandro Alves, também 43, que trazem consigo histórias que servem de inspiração, tamanha a luta diária para conseguir o sustento. Eles não pedem doação; comercializam rapadura e panos de pratos, respectivamente. “É um trabalho digno como todos os demais. Estamos na sinaleira trabalhando honestamente”, destaca Márcio, que reside em Sapiranga.

 

Após grave acidente, mecânico deixou profissão e foi para a sinaleira para sobreviver

Em meados de 2005, Leandro Alves, de Canoas, sofreu um acidente de trânsito e quase sofreu amputação da perna direita. Foram cerca de nove meses de internação e cinco cirurgias. A lesão foi tão grave que Leandro perdeu parte dos movimentos abaixo do joelho, assim como parte dos dedos. Na época do acidente, ele trabalhava como mecânico montador industrial de uma grande empresa, hoje vive da venda de rapaduras nas sinaleiras de Sapiranga. “Chego pela manhã e fico até 13h30, horário que tem o ônibus para voltar para casa. Apoiado em duas muletas, Leandro está há cerca de um ano nas sinaleiras de Sapiranga. “A vida não é fácil, mas não há outra alternativa”.

“Este é um trabalho que merece ser valorizado; tenho orgulho”

Diferente da maioria, que optam pelo trabalho na sinaleira por não conseguir emprego de carteira assinada, Márcio é o oposto. Por muitos anos, trabalhou em empresa calçadista. No entanto, após grave crise do setor, perdeu a vaga. Com isso, passou a buscar alternativas e descobriu na venda de sinaleira um novo emprego e melhor qualidade de vida. “Decidi fazer isso e estou feliz. Existem dias difíceis, mas no geral, compensa. Quando chove, não posso trabalhar. Mas, por outro lado, faço meu horário, trabalho com liberdade, sem ficar somente dentro de um ambiente fechado e minha renda é quase a mesma”, disse ele, reforçando que agora também consegue ter mais tempo para ficar com a esposa Cristiane e Márcio e Laura. “Sempre brinco que não irei enriquecer trabalhando, então preciso optar por algo em que eu consiga sustentar minha família e ter uma vida saudável. Não adianta trabalhar mais de nove horas em um dia, como fiz por várias vezes, mas depois não ter saúde. As pessoas têm um pouco de preconceito, elas acham que quem está na sinaleira é porque está pedindo; costumam sentir pena. Este trabalho que merece ser valorizado”.