Comentário: O Imposto sobre o Pecado

Dentre as funções dos tributos, sempre se sobressairá a arrecadatória. As funções de redistribuir renda e de regulação costumam aparecer apenas mascaradas de boas intenções, quando o Estado quer arrecadar cada vez mais.

 

A equipe à frente da controversa reforma tributária já planeja, para depois de sua aprovação, a implantação de um imposto seletivo, que teoricamente teria a função reguladora, que é a que busca induzir mudanças no comportamento, com desincentivos ao consumo de determinados produtos tidos como danosos à sociedade e ao meio ambiente.
O sin tax, ou imposto do pecado, é utilizado para impor maior tributação sobre atividades como o consumo de fumo, álcool e bebidas açucaradas e ultraprocessados, em razão do aumento de gastos públicos para lidar com seus efeitos. É uma forma adotada por muitos países para equilibrar a conta, já que a redução do consumo não se manifesta na proporção do aumento dos impostos, acabando por ser um mecanismo para aumentar a arrecadação sem gerar tanta resistência da população, sob o argumento de se aplicar a uma parcela da sociedade e com o objetivo de promover um bem social.
Ocorre que muitos dos produtos que são considerados danosos para a saúde, como os ultraprocessados, tem preço mais baixo e por isso são mais consumidos justamente pela população de baixa renda e de menor escolaridade, também mais sujeita à publicidade sedutora dos fabricantes.
É difícil crer que uma reforma tributária que aumentará a tributação da cesta básica de alimentos, pretenda melhorar a qualidade do consumo da população através da implantação de um imposto seletivo. Mesmo que o objetivo possa ser apenas arrecadar mais em produtos que continuarão a ser largamente consumidos, é interessante debatermos a respeito.
A maior taxação dos ultraprocessados não trará por si a redução do consumo, como pode-se comprovar com cigarros e bebidas, que já são pesadamente tributados. Sem educação e sem a facilitação de acesso aos alimentos naturais ou minimamente processados, estaremos apenas onerando ainda mais quem já tem menos.
A análise econômica do direito se presta justamente a analisar as leis com o objetivo de promover eficiência e maximizar o bem-estar. Os problemas sociais são complexos e infinitos e muitas soluções passam pela tributação. Mas essa deve ser pensada para além da mera política partidária, pois seus efeitos, positivos ou danosos, ultrapassam gerações e interferem pesadamente nas liberdades individuais.

Susana Arnold da Fonte
advogada especialista em Direito Tributário na Arnold da Fonte & Cardoso da Rosa Sociedade de Advogados. OAB/RS 87.812